Em 2005,
o historiador Sidney Aguilar Filho escutou de uma de suas alunas um relato
sobre tijolos marcados pela suástica nazista na fazenda Santa Albertina, próxima do
município de Campina de Monte Alegre, no interior de São Paulo. O docente da Universidade
Salesiana (Unisal) se
interessou pelo assunto. Em um primeiro momento, pensou investigar as heranças
de movimentos nacionalistas, correlacionadas com o cenário fascista e entre guerras que o mundo vivia nas décadas de
1940 e 1950. Ainda não sabia que durante os anos de feitura de sua tese de doutorado,
ele estaria mexendo em um vespeiro sobre a infância marginalizada do Brasil.
Entre
documentos que se esfarelavam, Sidney conheceu a história de 50 meninos de 9 a
11 anos que trabalharam na fazenda Santa Albertina na década
de 1930. Pobres e negros, eles cresceram no orfanato carioca Romão de Mattos
Duarte, até que a chegada de um homem com balas no bolso alterou seus destinos.
Selecionados por
causa de sua astúcia e disposição para pegar doces jogados na quadra, as
crianças foram levadas à fazenda para trabalhar em
regime de escravidão: eles capinaram, cuidaram do gado e cavalos, e
serviram à família Rocha
Miranda, que mantinha ligações com a Câmara dos Quarenta da Ação
Integralista Brasileira, movimento simpatizante do fascismo.
A pele dos animais ali criados era marcada com suásticas nazistas.
A
investigação da história das crianças deu origem tanto à tese de doutorado “Educação, autoritarismo e eugenia:
exploração do trabalho e violência à infância no Brasil (1930-1945)”,
apresentada em 2011 na Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP), quanto ao documentário “Menino 23”, do diretor Belisario Franca e da
produtora Giros.
Sidney
divide a pesquisa em duas frentes distintas que se complementam entre papel e
audiovisual. “Na tese, 70% provém da leitura de documentos e 30% da memória
viva, a contada. No documentário, acontece o inverso; a maior parte dele é
feita dos fragmentos dessa memória valiosa e dolorosa de personagens que
concordaram em cedê-la ao público”, explica o pesquisador.As
memórias preciosas e feridas são as de Seu Aloísio, Seu Argemiro e da família
de José Alves de Almeida. Seu
Aloísio – o Menino 23, porque não davam nome aos meninos trabalhadores – é um corpo
vergado pela falta de infância. Um homem que percorre os labirintos de sua
revolta, de não ter como responsabilizar quem fez dele “um homem sem futuro”.
Seu Argemiro
foi o único dos meninos que conseguiu fugir da fazenda. Mas a fazenda não saiu
de sua vida. Por muito tempo, ele foi morador de rua.
José
Alves, o Dois, vive nas lembranças de sua esposa e filhos; foi empregado
doméstico na fazenda Santa Albertina e, embora acreditasse em situação melhor,
cresceu com cicatrizes e tristezas persistentes.
Leia mais na publicação original em Rede Peteca
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