Dos 101,9 milhões de Brasileiros que trabalham, 3,3 milhões têm menos
de 17 anos (IBGE). Embora os índices de trabalho infantil tenham diminuído nas
últimas décadas, a exploração dos menores está longe de ser erradicada. Com o
corte de políticas públicas de incentivo, aumento da terceirização e os efeitos
da recessão econômica, o quadro pode piorar: “Em tempos de crise, isso se
agrava”, explica a juíza do trabalho Gabriela Lenz de Lacerda, representante
nacional da Justiça do Trabalho no Fórum Nacional da Infância e da Juventude do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Dos dez municípios brasileiros com maior índice de trabalho infantil
envolvendo crianças de dez a 14 anos, seis ficam no Rio Grande do Sul. Bozano,
Itapuca, Ubiretama, Novo Xingu, Lagoa Bonita do Sul e Toropi são as piores
cidades para ser criança no Estado, respectivamente, e nenhuma passa dos três
mil habitantes. O problema no RS têm características bem específicas, pois as
crianças se envolvem em atividades da família. Essa conflito torna a inspeção,
e a desejada erradicação deste tipo de irregularidade, uma missão quase
impossível na região Sul.
A questão cultural é determinante nesses índices, já que o contexto
familiar dos imigrantes que lidam com agricultura carrega uma herança cultural
que vai sendo aplicada nos mais jovens da casa. O pai que começou a trabalhar
na lavoura aos nove anos não vê problema em dar o mesmo tratamento ao filho de
dez. Neste espaço, onde a fiscalização é precária, essas condições são
naturalizadas e o modelo segue de geração em geração.
O cenário no âmbito doméstico não é diferente. Embora a lei não permita
que menores de 18 anos exerçam funções domésticas remuneradas, adultos seguem
recrutando garotas muito jovens, em situação de extrema necessidade, para
servirem em suas casas. Tanto o trabalho realizado no meio rural quanto o
doméstico dificilmente são denunciados: “As pessoas naturalizaram o trabalho
infantil e não enxergam quando aquela menina está fazendo a limpeza da casa,
não enxergam que a aquela criança não devia estar na lavoura”, afirma a juíza.
Segundo a juíza, o trabalho rural e o doméstico são os mais comuns quando se
trata de exploração infantil e o mais difíceis de serem denunciados. Confira
trecho da entrevista com Gabriela Lacerda sobre o tema:
Em 20 anos, o número de crianças em atividades formais caiu 59% no país
através de iniciativas da Justiça do Trabalho e organizações de apoio a
crianças e contra o trabalho infantil. De acordo com Gabriela Lacerda, a
diminuição ocorreu, principalmente, nas grandes empresas. Empreendimentos do
setor de vestuário e calçadista são exemplos tradicionais do uso de mão de obra
infantil e escrava, como o caso da empresa Brooksfield, flagrada em São Paulo
no ano passado mantendo cinco bolivianos em condições degradantes de
convivência. Entre os escravizados, uma menina de 14 anos.
De acordo com análise realizada pela Unicef (Fundo Nacional das Nações
Unidas para a Infância), 638.412 meninas e meninos entre cinco e 14 anos
trabalham mais de 28 horas semanais no Brasil. Se para um adulto conciliar
trabalho e estudo tende a ser exaustivo, para uma criança é ainda pior. De
acordo com a juíza, crianças em atividades trabalhistas acabam expostas a
consequências físicas e emocionais, como problemas na coluna e tendência a
depressão e ansiedade. Exigindo preparo e estrutura física que a criança ainda
não possui, o trabalho precoce pode provocar problemas sérios de saúde como
dificuldades respiratórias, distúrbio do sono, alergias e deformidades.
Além disso, após o surgimento de programas como o Bolsa Família, a
evasão escolar diminuiu. No entanto, a presença na sala de aula não garante que
as crianças estejam aprendendo. Estudo apresentado pela economista Ana Lucia
Kassouf, apontou que quanto mais jovem a pessoa começa a trabalhar, menor é o
seu salário na fase adulta. Esta redução no ganho financeiro é atribuída, em
grande parte, à escolaridade limitada devido ao trabalho na infância.
Consideradas as piores funções possíveis a serem desenvolvidas por
crianças, a prostituição e o tráfico são muito difíceis de fiscalizar. Os dados
de órgãos oficiais não contabilizam os menores envolvidos com essas atividades
ilícitas.
Fonte:Sul 21
Fonte:Sul 21
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